sexta-feira, 24 de julho de 2015

Interditos

1. Quando alguma ideia, prática ou objeto cujo uso se alonga no tempo e se desprende de seus pressupostos e preceitos, muitas vezes tornam-se interditos: pensa-se, age-se e usa-se de tal modo - não se sabe muito bem os motivos e, reconhecendo-os, teme-se suscitar seu questionamento. Portanto, para recuperar o espírito científico, é preciso ser novamente uma criança destemida, que inverte o pólo de um "não!" imperativo, que a tudo põe as mãos; monta e desmonta; quebra e pergunta sempre "por que?", age sempre por descobrir por si só as causas e consequências e formas e funções, etc.

2. Assim procede com o uso corrente da 3ª pessoa na redação científica - os moralistas: "pensamos ser justa a medida para tal dado"; e os hipócritas: "acreditamos ter chegado ao esclarecimento quanto à determinada coisa" - para nós, um vulgar vício de forma, pra dizer o mínimo. Qualquer néscio pode dele utilizar-se para simular uma equiparação científica para algo sem conteúdo, fundamento, estatura. Entretanto, num contexto de produtivismo oficialista; de carreirismo oportunista, talvez o conhecimento mais imprescindível seja, justamente, fingir-se muito bem, tal qual o fazia o poeta, empurrando aquilo que se pode chamar de ciência - não sem uma boa dose de má-consciência - um passo atrás e muitos degraus abaixo. 

3. A boa ciência, o bom problema é pontual; sua descrição é minuciosa, robusta e não se permite fugir do anteparo de um largo e profundo Estado da Arte, uma piscina em que o mergulhamos, pra dizer o mínimo novamente. É preciso desmontá-lo, entender a forma e função de cada peça e tentar montar novamente o brinquedo e vê-lo girar por si a partir da corda que nós puxamos. Dito isso, deixo claro: a boa ciência é a ciência mais difícil. Ainda não a arrisco mesmo e porque, com toda a fúria da minha vaidade intelectual, faminta como um monstro guloso, justamente, não sou um carreirista. "I'll save it for my feast later", one luscious famine would say.

4. Este é o nosso problema, a ser preparado com toda atenção, afeição e concentração que merece a boa refeição: Como deve ser a melhor educação? O que nos falta, fisiologicamente falando em comparação, por exemplo, com os cães, nos sobra em faro intelectual: aí reside um bom problema! E esta é a nossa hipótese, o arranjo das peças que armamos para o nosso brinquedo, com o qual nos regalamos como orgulhosos desbravadores: a escola deve desaparecer.

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