Eu costumava "pensar", até meus 22 anos, que a depressão e quaisquer outras questões da psicologia/psiquiatria eram blefes, exageros e todos os outros pré-conceitos das pessoas desse nível. Jactava-me de resolver minhas inquietações, esquadrinhar com excelência os tabuleiros de minha psiquê. Naïf!
Até que vivi, em determinado momento, uma tensão tão larga e profunda em minha vida que afetou a minha saúde física - o meu sistema imunológico -, instando-me a reconhecer o valor de tais questões: a minha saída da UnB, o meu nascimento dado à luz pela minha alma mater. E fora apenas um prelúdio! [Marca temporal: "Orgânico", Concreto Armado]
Pois, no ano seguinte abriu-se um abismo - o maior que havia visto até então - sob os meus pés; quase podia sentir a brisa gutural que vinha de baixo, assoprando tenebrosos assobios em meus ouvidos. Era uma madrugada terrível - da qual viria a Aurora. Mas, até que ela viesse, eu tive que enfrentar tantos monstro mitológicos quanto fossem possíveis. Por vezes, me via em um labirinto de vícios e fugas que me afastavam da luta inescapável - eu relutava em testar minha força e pegar em minhas armas. Tombei e, no desespero, procurei ajuda: encontrei a psicóloga linda. Até então, já havia tateado em todo canto do meu quarto escuro e nada: tudo me arrastava pra baixo. O "espírito do peso" de Zaratustra, a "Pluma de Chumbo"; e, nos últimos tempos, o "Sumidouro" (mas que bom que sou um bom nadador!).
A psicologia é um arremedo de ciência humana e biológica. Segundo alguns mais críticos, uma arte falseadora da filosofia - caso de Freud para com Nietzsche, por exemplo. TODAVIA, vejamos as condições do mundo em que vivemos e entenderemos como as pessoas gastam 125 R$ por hora de conversa com alguém que se abra a ouvir nossas angústias: Onde estão nossos amigos? No facebook, ocupados em publicizar seus hábitos de consumo, um hedonismo medíocre; nas mesas de restaurantes universitários e bares - amizades por conveniência, por egolatria - pessoas que tomam a seus "amigos" como bibelôs das opacas vitrines de suas virtudes sociais - gente pequena que a tudo apequena, anões plúmbeos! Desses amigos, sempre mantive sanitária distância.
De espécie diversa - aqueles que sempre me agradaram a companhia quando, mesmo depois de anos de distância, vivenciamos a experiência do comum com a mesma intensidade - os que se abrem como piscina ou cachoeira ou mar para um mergulho ou que são, eles próprios, mergulhadores de fôlego e destemidos desbravadores de profundezas - acabei de descrever-me a mim mesmo -, estas são, sim, amizades que valem a pena e que podem, dadas as circunstâncias da fortuna de um, contribuírem para o edifício de uma fortificação em alguém. Estes amigos, desnecessário dizer, são raros, pois, é rara a sua grandeza. Outrora, são eles próprios contraproducentes - como uma água turva em que se deve desconfiar do mergulho. Aí, exige-se de um o filtro para tal turbidez - um filtro da moral: se se der ouvidos à moral, que em nosso peito ela não se abrigue; que não se deixe molhar os pés na lama.
Ora! E pagaremos para recebermos um julgamento moral?! Pois, é isso a psicologia! Pagar pela satisfação da lascívia é mais digno!
Entretanto, não me é dado o prego de crucificar ninguém: todo erro é uma oportunidade para aprendizado - este é o pressuposto, o primeiro instante do conhecer: ignorar. Se um se encontrar sob a opressão de uma bigorna no peito; do mundo sobre as costas; a lâmina sob os pés; a espada sobre a cabeça, - ora, que se vire! Use as armas que tenha em mãos! Um psicólogo, que seja!
A psicóloga linda, ao menos, nutriu minha vista de beleza e de uma inteligência admirável, era um prazer caro estar com ela. Mas, não sei dizer até que ponto; em que medida ela contribuiu para a minha batalha. Talvez, me disciplinando a ter mais paciência com o tempo da minha verdade interior [Marca temporal: "Aeternum Phoenix"].
Pois, tive que debulhar muitos frutos podres que enlameavam a minha terra e fazer deles adubo; muitos cadáveres insepultos e outras moribundas figuras que me apareciam pelo caminho - e de tudo fazer corda para minha guitarra; das pedras no caminho, marcas da trilha e apoios de descanso. Tive que matar meu pai em mim: para tal, tive eu mesmo de ressuscitá-lo - aquela ave agourenta! Minha mãe, dela já havia me afastado com um golpe sangrento no ventre: cortei o cordão eu mesmo. Tive que nascer de novo - ir para além da minha origem naquilo que chamou a si mesmo um dia nobre: para além do bem e do mal, por intuição. Tive que matar o medo da Tragédia e admirar a sua beleza. Pois que é ela o meu caminho. Não peço a ninguém que siga meus passos e venha trilhá-lo, a ninguém além de mim é ele devido.
Tive que decifrar meus pesadelos, despi-los de seu terror e encará-los como sonhos - mensagens do meu eu-interior, o ser uno-primordial acenando através do meu sono: O tornado à minha frente que a tudo dragava, contra o qual eu tentava salvar a quem me era querido - a minha melhor amiga; as fantasmagóricas figuras de crânios em chamas, de quem eu dissimulava a admiração nos becos escuros, com vergonha. Tive que matar a vergonha que tive de mim mesmo. Tive de perdoar-me.
Hoje estou sóbrio e só. Não acredito em fantasmas desde a segunda infância; não vejo mais cadáveres putrefeitos pelos cantos de mim mesmo. Tudo foi arejado pelo tempo, que trouxe as bactérias necessárias à decomposição das folhas daquele outono. E posso florescer, ainda. Agora eu [re]conheço que tudo retorna eternamente em trajes e danças diferentes e eu amo o meu destino. Agora, estou, e me sinto, em casa.
A Minha Casa
A minha casa é qualquer lugar
Em que as paredes puderem testemunhar
A minha fortuna e a minha ruína
Em busca do elixir vou cumprir a minha sina.
O meu palácio onde posso ordenar
Que o silêncio altivo venha me adornar
O meu banquete pro meu paladar
São livros e discos que eu possa devorar
De tão são, até perdi a razão
De tão santo, até perdi o encanto
Tão veraz que cri uma vez mais
Na magia em que até a ciência acreditaria
O meu casulo de onde devir cigarra
Metamorfose que faz da guitarra asa
O meu cantar cresce em mim pra voar
E ao romper o escudo estou pronto pra tombar
A minha concha pérola esconde
Brilho lustroso por entre visco asqueroso
Se eu findar-me em vitrine disposto a ornamentar
Como vou lamentar entre os porcos chafurdar?
Brilho lustroso por entre visco asqueroso
Se eu findar-me em vitrine disposto a ornamentar
Como vou lamentar entre os porcos chafurdar?
De tão são, até perdi a razão
De tão santo, até perdi o encanto
Tão veraz que cri uma vez mais
Na magia em que até a ciência acreditaria
O leito em que deito desafiado por sonhar
É de pedras que arrasto pelas curvas que escavo
Serei profundo ou apenas a água que turvo?
Quando vou decantar no abissal do mar?
De tão são, até perdi a razão
De tão santo, até perdi o encanto
Tão veraz que cri uma vez mais
Na magia em que até a ciência acreditaria
O lugar pra onde quero ir, o lugar que preciso
Se ele não existe, então, terei de criá-lo
O lugar que existe a partir do momento em que crio
É o lugar em que eu finalmente caibo.
O lugar que existe a partir do momento em que crio
É o lugar em que eu finalmente caibo.
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