quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Impotentes de Esquerda

Há um aforismo no "Além do Bem e do Mal" interessantíssimo para analisar - por analogia - aquilo que, com algum desgosto, ainda chamamos de esquerda do espectro político hoje: 

 "Não o seu amor ao próximo, mas a impotência do seu amor ao próximo é que impede os cristãos de hoje de nos - queimar" [104] 

Os cristãos - o poder de características cristãs enraizado na estrutura das sociedades -, por séculos atacados pelas ondas seculares, com o advento da modernidade - em que a obrigação da cristandade tornou-se uma ofensa indefensável - não mudaram de "opinião" acerca de si mesmos, mas, deveras, têm certa vergonha dessa opinião e não mais agem com tanta truculência e estupidez para defendê-la. 

O que é a esquerda hoje? São meia-dúzia de estúpidos que, não fosse a vergonha da tragédia que experimentaram no século XX; não fosse o rídiculo fim da União Soviética - cujas empresas públicas foram vendidas a preço de banana para grupos corporativos ocidentais, em parceria com o capital russo, dos burocratas -, ainda nos fuzilariam - a nós, os espíritos livres, questionadores, que não pensam igual e que, ainda mais, se recusam a pensar igual - em praça pública, cheios de um estúpido orgulho. 

Ah, quantas questões Nietzsche antecipara há 130 anos! Como diz o próprio tradutor no posfácio, é um livro inesgotável.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Um Pouco Daquilo Que Se Chama Amor

Tu não me lês, não por mau gosto, mas por uma incapacidade fisiológica: tudo o que sou sempre foi-te indigesto e, justamente, pois, incompreensível. Quanto a mim, apenas como adorno da tua experiência estética te interessava: sem isto a que tu chamaste de "amor", o mundo, incontornavelmente, te pareceria uma triste rocha pendurada no espaço - uma calúnia contra a Terra! É por isso que ele, este teu amor, sempre me pareceu um tanto desesperado, uma angústia mal encaminhada - pobre de ti se perdestes o teu objeto de afeição! Chame de amor, ou do que mais quiser apelidar, contudo aquilo sempre será: tua vingança contra a vida pela tua pobreza dela.

De minha parte, justamente por pressentir, encarnar e afirmar a prescindência de um adorno para a minha experiência estética, de uma fantasia para um carnaval - pois, a minha carne sempre teve valor, e a vida na Terra, uma dádiva... - e eu sempre tive a mim mesmo por completo, com as cores que me dotaram a natureza - que eu pude ter por ti o que um dia chamei de "amor": uma fuga de mim mesmo, uma curiosidade teimosa, uma vontade de brincar, de correr riscos, uma vontade de poder negar a mim mesmo no outro. E foi assim que ambos sucumbimos.

E, daqui em diante, quem não puder vislumbrar no primeiro instante a que grau de humanidade pertenço, tem para mim pouco valor. E quem não puder perscrutar a minha máscara e se maravilhar e querer brincar - eu nunca poderia - amar!