quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Brasil, Nunca Mais

Recentemente, faleceu a senhora Maria Rosa Monteiro, mãe do icônico Honestino Guimarães, este estudante de Geologia da UnB que a nossa ditadura civil-militar mandou pra algum lugar desconhecido... A luta de sua mãe pela verdade sobre o filho tornou-se simbolo de toda a luta pela publicação dos arquivos e punição aos torturadores do período militar.

(Em tempo, devo dizer que o STF que julga o mensalão pra "proteger a república" e a constituição, guardando óbvia coerência,  não o fez assim quando julgou improcedente a ação da OAB contra a a Lei da Anistia de 1979. 1979!)

Até algum tempo atrás eu pouco (quase nada) sabia sobre este cidadão, Honestino. Pesquisando, descobri que ele era de Itaberaí, Goiás (partindo de Goiânia, última cidade antes de chegar em "Goiás", a cidade origem da minha família, pela qual eu sempre passava...), que sua família era de advogados e que, talvez, até o seu pai tenha conhecido meu bisavô, Urbano, também advogado (isso minha mãe supôs, dentre as suas memórias, pelo sobrenome da família Monteiro).

Quando me dei conta do quão próximo um líder estudantil assassinado pela ditadura estava de mim, do quanto de nossas vidas pode ter sido em algo similar, seja pela Serra Dourada ou pela Universidade de Brasília, compreendi e fiz parte de toda esta luta pelo resgate de nossa memória coletiva. Da memória dos que luta(ra)m e sonha(ra)m.

Neste instante, surgiu-me como epifânia a ideia de compor uma canção de homenagem, de protesto, que seja, sobre esta história... Lembrei-me daquele livrinho clássico, "Brasil, Nunca Mais" e da sua significância neste contexto. Percebi que poderia usar o jogo de palavras com o nome do "álbum" que eu estava compondo, "Futuro, Adeus!". Ora, quem diz adeus ao futuro só pode ser, justamente, aquele que ficou no passado. Assim, esta canção, quase como uma psicografia, põe na primeira pessoa a voz daqueles tantos que tombaram pelo sonho da democracia, da justiça e da igualdade...

Deles, florescemos nós que, presentemente, lutamos cotidianamente pelo alargamento dos espaços de felicidade nesta vida...
E podemos lutar com algum conforto à custa da tortura e execução de muitos no passado.
E lutamos sob alguma hipocrisia, sobre os ombros largos de tantos escravizados, desterrados e massacrados povos do presente, no Brasil e no mundo.

De todo modo, lutamos como podemos. Mantemos acesa a chama do sonho.

"E se não achar meu caminho
basta-me crer procurá-lo de coração."
Honestino Monteiro Guimarães
(1947-1973?)

"Brasil, Nunca Mais"
(Letra e Música: Juliano Berquó)

Avise minha mãe,
Avise minha filha e toda minha família
Diga que eu não perdi a fé
E que apesar das circunstâncias
Eu morri de pé.

Avise a minha querida
Que a minha vida não foi em vão
Que valeu a pena
Avise minha pequena.

Avise aos jovens nas salas de aula
Que não tivemos escolha
Que não nos deixaram nada
Que pensar nos condenava

Por fim, eu peço
Que avisem aos nossos inimigos
Que nós continuamos vivos
Mais que nunca nas lutas

O meu pelos seus
Futuro, adeus...
Mas não se esqueçam de nós
Céu vermelho-anil
Brasil, nunca mais...
E vivam em paz.

In Memoriam: Maria Rosa Monteiro.

Mitomania

Há tanto tempo sem postar que eu já nem sei como fazer nessa nova interface do blogger...
Até eles estão contra mim!
Publico hoje esta canção cuja letra está ulteriormente exposta. Muita coisa aconteceu desde minha última postagem...
Durante a última greve dos professores da UnB eu terminei o projeto da minha banda de um homem só, Concreto Armado (lá se vão oito anos...), "Futuro, Adeus!" ("Brasil, Nunca Mais" e "Senhor de Engenho no Senado" fazem parte deste trabalho).

Em setembro, com a retomada dos trabalhos na UnB, estive recluso para a finalização da minha monografia. Formado, logo retomei os trabalhos com as minhas composições, finalizando outro projeto no qual estava trabalhando há quase um ano, "Indizível". 
Mas eu não vou ficar falando disso muito não. Com o tempo, pretendo promover e publicar para download todas estas músicas por aqui. 
Por enquanto, fica aí e curte o som dessa que faz parte do "Indizível" que é o melhor que eu posso fazer.

"Mitomania"

Desde quando nasci nunca vi a luz do sol
Flanei por instinto depois de cair no chão
Assim, quando nasci não fui parido de cordão
Me alimentara no tubo de tudo do canal
Nunca tive fome de não saber quê comer
Aprendi a ter vontade de ter quando vi TV
Nas tantas vezes em que morri desde quando nasci
Depois de crescer, eu aprendi a mentir

Aonde levam estas dores que afloram do afeto?
Onde reside minha razão, mãe do meu direito?
Que posso fazer para corrigir o meu defeito?
Agora que o gene do mal já está desperto?

O que vi ao longe e que parecia miragem
De repente, veio a mim ou fui a ele, que é verdade?
Cortara minha garganta enquanto a guerra inflamava
A música havia, mas eu não pegara em armas
Então, fugi do campo de batalha
Quando o sol estava baixo, saí sem dizer nada
Expunha minhas entranhas que, alimentadas de anseio,
Perdido o esteio, abandonava-as no convés

Quando quis o que quis, soube o que era a morte
Que cortava o couro e desfiava véu profundo
Onde estava o norte, velho e forte, nunca soube
De tudo que é escrita, só quero o que me cabe
O resto não resumo, sem posse nem repouso
Por dentro, ouso o sentido de pertencimento
Da bolsa que obriga saber como lhe partir
Depois de crescer, aprendi a resistir

Que faço com este canto que tanto pesa no peito?
Com estes versos afoitos que brotam quando escrevo?
Que faço com esta chama que tanto me queima?
Será que o fogo que consome ainda me anima?

Meu melhor ataque foi minha defesa
Quando o sol estava alto, quis sombra e água fresca
A porta que se abria de passagem foi à tinta
De todo minério, quem nunca viu metais?
Cantais todo mantra que se eleva com o fogo
De onde tudo emana, o céu mais que azul
Fui cantar meu sotaque, qualquer coisa ainda tento
Pro tempo que fulmina, tenho papel e caneta

A vertigem sonora que dobrava minha unha
Era tudo que eu queria quando o sol se punha
Essa febre constante que não me mata a sede
Que não me mata o sonho, não sei por que componho
Desta rosa que tanto pesa, feito pluma de chumbo
Não me reste platitude metamórfica de flor
Fui rasgar meus contratos, qualquer canto mais distenso
Talvez ainda pense no tempo mais que perfeito

Só quem sabe como é triste cantar sozinho
Sabe o quão profundo que lhe atinge o espinho
Só quem sabe ver o louco e ouvir seu uivo
Pode saber o que nele ainda há de vivo
Na madrugada fria, quando estiveres na cama
Lembre dele na praça com uns trapos de coberta
Se no manuseio do que corta, um descuido
Encontre teu reflexo na sua ferida aberta

Ficha: 
Bateria e teclados - Piano Eletrônico 4.3
Gravado com Audacity.
Voz: Juliano Berquó, com alguma desafinação residual. 



Que minha presença no mundo incomode tanta gente quanto for possível;
Que minhas opiniões sejam sempre incompreendidas e combatidas por todos;  
Que eu perca tudo em absoluto, menos esse meu bom humor invejável..! 
Antes que eu morra.